Olhem a data
em que foi escrito esse texto. Por incrível que pareça, nada mudou. Parece que
o estou escrevendo agora, junho de dois mil e vinte.
Fui mais uma
vez instigado a escrever sobre o abandono e a exploração dos idosos neste país
que mostra para o mundo um povo ordeiro e alegre. Mas na realidade somos, com
muitas e belas exceções, milhões de exploradores sem coração e sem piedade.
Eu poderia
estar escrevendo um texto mais ameno, com menos palavras duras. Mas quero
deixar aqui o meu desabafo para que muitos idosos tenham coragem de não se
deixarem dominar pelos filhos e outros parentes.
De manhã,
durante a caminhada, conversei com o Sr. Manoel. Um velhinho simpático com
oitenta anos. Viúvo, mora sozinho, e todos os dias faz uma caminhada de
aproximadamente quatro quilômetros. Há uns meses atrás lhe perguntei como era
sua vida. Sua resposta foi o retrato da realidade da maioria dos idosos deste
país das desigualdades; -Os filhos e netos acham que a gente não precisa do dinheiro da
aposentadoria para viver.
De cada dez
aposentados, oito podem dizer a mesma coisa. E quanto maior for o valor da
aposentadoria, mais violência e abandono eles sofrem.
Muitos
idosos que ainda não se aposentaram também são reféns de seus filhos e outros parentes.
Mesmo com
esse problema o senhor Manoel continuou com sua vida tranquila. Arranjou uma
companheira com quem viveu alguns meses, e voltou a morar sozinho com sua
solidão, sua religião, simplicidade e tranquilidade que me causam inveja. Hoje
ele disse que uma de suas filhas separou-se do marido e voltou para sua casa trazendo três filhas adolescentes. O que mais me impressionou foi sua
tranquilidade ao dizer que continua arrumando a casa, cozinhando e lavando a
roupa, inclusive das quatro "intrusas" que agora acham-se donas do
pedaço.
Eu lhe disse
que deveria tomar uma atitude mais enérgica para mudar esta situação. Sua
resposta foi ainda mais surpreendente: -Sr. Geraldo, Jesus mandou a gente ajudar os outros. Eu
não posso abandonar minha filha e minhas netas.
É exatamente
isso que os filhos ainda não entenderam. Milhares agridem, exploram, e
abandonam aqueles que os geraram, e que abriram mão das suas vidas para
satisfazerem as necessidades de filhos irresponsáveis e sacanas. Milhares de
senhores Manoeis estão espalhados por esse Brasil de carnaval e hipocrisia.
Ainda
contagiado pela lição de amor ao próximo, indignado com a maneira de como ele é
maltratado dentro da sua própria casa, despedi-me do senhor Manoel e fui
caminhando lentamente para casa. Nesse trajeto encontrei-me com dona Maria, uma
senhora que como milhares espalhadas por esse país, como fazia todos os dias,
levava sua neta à escola e no trajeto ia catando latinhas para complementar sua
renda.
Se já estava
indignado com a situação do Sr. Manoel, esta indignação aumentou depois de
conversar alguns minutos com a dona Maria. Parecia o segundo capítulo de um
filme de terror que amedronta milhares barracos e mansões todos os dias. Ela me
falou que cuida de cinco netos, que há alguns meses fez um empréstimo para
ajudar um dos filhos construir um apartamento em cima da sua casa. Continuando
a desfilar um rosário de tristeza, disse que outro filho vai se casar, que construiu
um barraco no fundo do quintal para que ela se mude, porque o sem vergonha irá
ocupar a casa da frente que antes era dela. Lugar de velho é em um quartinho
dos fundos onde se acumulam as sucatas.
Este é o
retrato e a realidade nua e crua de milhares de pessoas que tiveram a ousadia
de envelhecer.
E os nossos
fazedores de leis são tão, ou mais sacanas, que fazem do nosso país o berço
esplêndido dessas sacanagens e da injustiça.
Pensando em
como descrever essas aberrações, o dia foi passando. Coincidentemente nesse
mesmo dia o noticiário da tarde mostrou uma reportagem sobre o aumento da
violência contra os idosos.
Aí, a minha
indignação extrapolou os parâmetros da paciência. Os números mostravam
apenas os que chegam às delegacias de "Proteção ao Idoso", um órgão
fictício que existe somente para dar emprego, e para mostrar para a mídia e
para o povo que o governo está "preocupado" com sua população
envelhecida.
A lei é
sacana! O estatuto do Idoso é sacana! Segundo esse mesmo estatuto, o filho é
obrigado a cuidar dos pais, principalmente na doença e na velhice. Mas lei
nenhuma consegue colocar amor no coração de ninguém. Quando o coração se fecha
para o amor, nada é capaz de colocar lá dentro um pouco de caridade, de carinho
e compreensão. Esse famigerado
estatuto, com todo o respeito a quem ajudou na sua formatação, não levou em
conta o básico para se levar uma vida digna: Respeito, Caridade, Doação, uma
pitada de amor, e uma grande dose de bom senso. O estatuto enquadrou nas mesmas
condições, os asilos de caridade que cuidam de pessoas carentes, com os asilos
da inciativa privada que muitas vezes pensam somente em faturar em cima da dor
e do abandono.
Estou
colocando aqui a minha opinião pessoal. Não estou autorizado pela SSVP para
escrever em seu nome, mas ela deveria transferir para os órgãos públicos todas
suas casas de acolhimento, isto é, os asilos, que a justiça faz questão que
sejam chamados de LARES. É revoltante ver uma diretoria voluntária ser refém de
um poder executivo que contribui com uma esmola. De uma Promotoria do Idoso que
enxerga apenas os artigos frios das leis. Dos Assistentes Sociais que só
enxergam com os olhos dos estatutos, e nunca colocam a caridade como termômetro
para se acolher alguém que precisa de proteção. E o que é pior, quando a
Promotoria e a Assistência Social obrigam uma Instituição de caridade acolher
um idoso que está sendo maltratado no seu lar, essas mesmas autoridades não
obrigam os agressores a contribuírem com alguma coisa para o seu sustento. E
nem se dão ao trabalho de verificar que, de cada dez idosos que chegam ao
asilo, oito vem com um empréstimo na aposentadoria, feita pelo mesmo sacana que
o agrediu. Simplesmente tiram um "fardo” das costas de um filho, ou de uma
família marginal, e colocam na de pessoas voluntárias que são obrigadas a
obedecer.
Eu poderia
escrever dias a fio, mas vou parar por aqui, na minha modesta opinião, consegui
retratar o JEITO DE VIVER DO IDOSO BRASILEIRO
Olá, Geraldo!
ResponderExcluirQue triste e dura realidade, que você descreve em seu texto. Idoso é considerado "lixo", portanto "hiberne" no quartinho, bem pequenino, dos fundos.
E esses filhos/as falam de Deus e da igreja que frequentam. O k lhes é lá ensinado, lá
Em Portugal, há um provérbio k diz: pai e mãe têm uma peneira, um véu bem opaco, pra você entender, k não deixa ver as incorreções e defeitos dos filhos. O Sr. Manoel e a D. Maria são os protótipos dessa horrenda e interminável "novela".
Bom fim de semana.
Abraços.
Olá Geraldo! É realmente lamentável! A partir do nascimento a pessoa começa a pagar imposto até do ar que respira. Cresce, trabalha durante toda a sua vida enquanto pode, põe filho no, procura dar o melhor possível, e o resultado é um quartinho nos fundos, até o dia da visita dos bichinhos famintos, residentes na terra. Belo, profundo e pertinente texto para a atualidade.
ResponderExcluirAbraços,
Furtado.
Ah, Geraldo, eu tenho visto idosos serem tratados como cão sem dono, pois alguns cães são melhor tratados que certas pessoas. Os estatutos são frios feito por gente frias, que apenas criam e deixam ai bel prazer dos humanos(sic). Assim é a mulher neste país onde ainda vive sob uma ditadura masculina, os menores são lançados ás feras do cotidiano. O Estado lava as mãos.
ResponderExcluirSe fizer uma pesquisa por este imenso Brasil vamos tomar um susto enorme com a condição de vida de nossos idosos. É possível até encontre alguns acorrentados.
Seu grito tem eco amigo.
Um abração.