01 outubro, 2010

MEDO DE ASSOMBRAÇÃO

   Este é o sr. Manoel, morador do asilo, já falecido

 

O que e quem me trouxe para este asilo, e por que fui condenado a este exílio?
Qual foi o crime cometi?
As pessoas que aqui trabalham fazem o melhor que podem e somos tratados como se fossemos uma grande família.
Família...
Já nem sei o que isso significa e tem hora que dá uma vontade danada de conversar com os meus filhos e filhas, mas não sei onde eles e elas estão ou se ainda querem conversar comigo. E à noite enquanto o sono não chega fico escutando o ressonar dos outros que dormem ao meu lado e bate uma saudade do quarto que agora não é mais meu e  da casa que deixei para trás, e que agora também não é minha. Quando ouço passos se arrastando, por uns momentos sou levado para o tempo em que meus filhos eram pequenos e caminhavam para minha cama com medo de assombração.
Quem será que se levanta de madrugada para cobrir os meus netos como eu fazia com os meus filhos?
Não consigo entender!
A velhice, além da saúde, tirou tudo que eu tinha.
Liberdade.
Família.
Até os amigos esqueceram, ou não se interessaram em saber que este asilo é o meu atual endereço.
Se me perguntarem se aqui é bom vou repetir mil vezes que é o melhor lugar do mundo.  
Afinal, foi esta casa que me acolheu e aqui não tem ninguém gritando ou falando pelos cantos que vai me colocar em um asilo.
Eu já estou aqui! Sei que causo os mesmos problemas que causaria em casa, mas todos que moram aqui estão na mesma situação.
Dependentes da boa vontade de estranhos. A diferença é que as pessoas que cuidam de mim conhecem as minhas carências, e pelo fato de terem me visto pela primeira vez do que jeito que estou, não me cobram nada.
Elas agora estão substituindo os filhos que eu não soube criar ou que não gostaram de terem nascido sob a minha proteção.
Não tenho nada a reclamar do tratamento recebido pós-abandono.
Mas que eu sinto uma saudade danada de ter alguma coisa para novamente chamar de meu
Isto eu sinto.

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