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Ficar velho também é desencontro, é desencontrar de tudo que foi feito,
das coisas que plantou com carinho e dos filhos que gerou com amor. É parar no
tempo e sentir que o líquido da vida já não corre nas veias como há uns anos
atrás. É não ouvir mais as batidas do coração já cansado, que não consegue
alimentar o corpo. É sentir que a morte chega implacável, e aceitá-la
resignadamente, mesmo sabendo que a vida seria muito melhor que morte, se as
pessoas que amamos nos ajudassem a ir ao seu encontro com serenidade e com
carinho.
Natural!
Pai e Mãe, enquanto tinham forças e lutavam para que os filhos pudessem crescer com dignidade. Quando suas casas se enchiam de filhos, netos e bisnetos, e a saúde permitia ir para o fogão fazer coisas gostosas, ou preparar o churrasco que era consumido com alegria, eram amados e essenciais na união da família.
Pai e Mãe, enquanto tinham forças e lutavam para que os filhos pudessem crescer com dignidade. Quando suas casas se enchiam de filhos, netos e bisnetos, e a saúde permitia ir para o fogão fazer coisas gostosas, ou preparar o churrasco que era consumido com alegria, eram amados e essenciais na união da família.
Hoje, são velhos e motivo de discórdia. Poucos se colocam à disposição
para ajudar cuidar daqueles que não souberam fazer outra coisa na vida, a não
ser se preocuparem com os filhos.
Qualquer quartinho serve para abrigá-los, isto, quando a família deixa
que ele ocupe um pequeno quarto na sua própria casa. Os trastes são jogados em
qualquer lugar.
Vou levar este velho para um asilo. Não aguento mais, ela parece
criança! Lugar de velho é no asilo. Eu não posso nem sair! Quantas vezes estas
frases são repetidas em muito lares de pobres e ricos?
Quando você era criança seu pai não te levou para um orfanato, agora
você quer levá-lo para um asilo? Quantas
vezes sua mãe pensou a mesma coisa, mas continuou com você no colo.
Seu mundo é muito pequeno para quem lhe deu a vida, sua casa é pequena
para abrigar quem te abrigou até transformá-lo no que és hoje. Se seus pais lhe dão trabalho e perturbam seu
sono, pense nas inúmeras vezes que ele teve de ir para o trabalho com sono porque
você chorou a noite inteira e não o deixou nem cochilar. Pense nas noites que
ela ficou com você no colo, acariciando-o, tentando faze-lo dormir e teimavas
em ficar acordado.
Quando você ficar velho qual será o seu lugar? Enquanto você tem tempo e saúde, procure
visitar um asilo, e honestamente responda para si mesmo. Gostaria de morar ali?
Converse com os exilados. Descobrirá que a grande maioria gostaria de
estar morando em um barraco de favela, ou mesmo, perambulando pelas ruas, a
estar ali vinte e quatro horas por dia sem fazer nada a não ser esperar a morte
que a cada dia leva um de seus companheiros.
Pergunte qual é o grande sonho deles. Verá que a grande maioria quer
voltar para casa. Qual casa? Muitos
foram expulsos da sua pelos próprios filhos. Verá que muitos sentem saudades. E
como dói.
Deve ser doloroso ficar horas e horas olhando para as paredes pensando
no sorriso do filho, da esposa, dos aborrecimentos e carinhos dos netos.
Uma vez fui fazer uma sindicância onde uma família queria colocar uma
senhora de noventa anos no asilo. Eu ponderei que poderia até morrer primeiro,
mas que ela já estava com uma idade avançada e que eles poderiam esperar um
pouco mais. Lembro como se fosse hoje, a filha que pediu a sindicância tinha
sessenta anos, suas três filhas moravam em barracos construídos no lote da avó.
A senhora disse que a mãe dava muito trabalho, que resmungava por qualquer
coisa, e que ninguém queria ajudar nos cuidados que a velhice dela exigia.
Como a idade limite para acolhimento no asilo era exatamente sessenta
anos, propus levar as duas, Mãe, e filha que prontamente recusou dizendo que
não era mais preciso levar sua mãe.
Em outra sindicância, uma família de nove filhas e um filho queriam
colocar o pai no asilo. Ele morava em um pequeno quarto nos fundos da casa de
uma das filhas, e o genro me disse que ele dava muito trabalho, que gastava
muita água para lhe dar banho. Propus construir um banheiro com chuveiro, Ele
disse que o sogro era muito pesado. Propus arranjar uma cadeira de rodas. Então
me deu uma raiva danada, porque vendo que estava ficando sem saída ele me falou
de tinha nojo de dar banho no sogro.
Provoquei uma reunião com toda a família e vi o tamanho do desencontro
que infelizmente existe em muitas outras famílias. Um dos genros disse que só o
aceitaria em sua casa se ele ficasse trinta dias na casa de cada um.
Eu ponderei que estávamos falando de um ser humano, e não de uma
bicicleta velha que cada um jogaria por cima do muro de trinta em trinta dias.
Depois de muita discussão, decidiram que iriam cuidar do velho, infelizmente
ele faleceu vinte dias depois. Os filhos não tiveram o prazer de cuidar de quem
lhes havia dado a vida.
Eu poderia ficar narrando inúmeros casos, cada um mais triste.
Os nossos idosos não nos interessam, seus problemas são naturais da velhice
e da morte que se aproxima. Suas histórias já não nos dizem respeito. Não
precisamos de ninguém para nos contar histórias para dormir. Suas ideias são
ultrapassadas.
Asilo deveria ser um lugar onde a visita fosse restrita a filhos e
irmãos reconhecidamente carentes, a familiares distantes, aos amigos, e aos
visitantes desconhecidos.
Um filho não deveria ter o direito de visitar um pai ou uma mãe. Asilo
não é lugar para pessoas que ainda tem filhos, por mais pobres que sejam.
Nossos idosos precisam de liberdade, e nesses casos, um barraco na
favela é melhor que o mais luxuoso dos asilos. Precisamos estarmos alertas, o
tempo passa depressa e vamos ficando velhos, se não soubermos educar nossos
filhos, o nosso futuro poderá estar em um asilo, ou jogados em um quartinho
onde se guardam os trastes inúteis.
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