11 setembro, 2010

ALGEMAS DE CARIDADE.




Fico observando o semblante dos moradores do asilo com seus olhares perdidos no vazio. Às cinco horas da manhã na casa já se ouve passos nos corredores. Os que conseguiram dormir começam a acordar para mais um dia de andanças de um lado para outro,  e alguns sentam-se em frente à porta do refeitório esperando a hora do café. 
Um televisor é ligado apenas para colocar um pouco de cor no preto e branco da vida de quem foi abandonado.
Os que têm algum distúrbio mental estão no céu e os que ainda pensam estão no purgatório para terem tempo de se lembrarem dos motivos que fizeram deles mais um morador desta casa de ninguém e de todos.
Alguns vieram porque não souberam ser pai ou mãe no cuidado com os filhos, outros, porque os filhos, mesmo sendo criados com carinho se esqueceram de quem os gerou.
De vez em quando uma lágrima teima em rolar por entre as rugas de alguns dos moradores, caída dos olhos que já se acostumaram com o choro. Outros gritam a todo instante que querem voltar para suas casas.
Os que não tiveram filhos e netos estão no paraíso e os que ainda os trazem na lembrança estão no limiar da indiferença que machuca.
Alguns não querem tomar banho.
Se arrumarem para quem?  
O carinho dos funcionários, dos voluntários e dos poucos visitantes não é o bastante para suprir a ausência de quem foi gerado e visto crescer. E o dia vai passando na vida de quem já não sabe medir o tempo.
Hora do almoço.
Uma oração pede ao Todo Poderoso que abençoe o alimento e o resto de vida de cada um. Mãos estranhas levam a comida na boca de quem fez isso inúmeras vezes em quem o colocou neste asilo e que nesse momento deve estar em casa almoçando tranquilamente sem se lembrar do estorvo que atrapalhava seu almoço.
Os que conseguem dormir voltam para suas camas, outros sentam-se novamente em frente ao televisor como se estivessem entendendo alguma coisa.
Quando filhos ou filhas vem visitar a mãe ou o pai, coisa rara, algumas cenas são patéticas.
Nenhuma emoção!
Nenhum abraço que emociona!
Trocam algumas palavras como se o ser gerado fosse apenas mais uma visita para aquela que foi sua primeira moradia ou para aquele que num momento de tesão e de ternura, ou só de tesão, gerou mais esta vida.
Os que conseguem vislumbrar o firmamento tentam falar com Deus que tudo vê e sabe que este purgatório é realmente a porta de entrada deles no céu.
Tem tarde de domingo que o ambiente e o silêncio são um martírio.
Os moradores não conseguem conversar uns com os outros e nenhum visitante se digna aparecer.  
A grande maioria não se lembra das palavras do Mestre: “Eu estive preso e me visitastes”.
Aqui os moradores são prisioneiros do tempo, da idade e dos erros e acertos na criação dos filhos e filhas, e por terem tido a ousadia de envelhecer agora estão presos com algemas de caridade, de perdão e de ternura até mesmo quando agridem os funcionários que agora cumprem o papel que seria do filho ou da filha.
  

Um comentário:

  1. OI GERALDO!
    MUITOS FILHOS TERIAM QUE LER E SE DEIXAREM LEVAR PELO AMOR POR AQUELES QUE LHES DEU A VIDA,O ALIMENTO,O VESTUÁRIO E PRINCIPALMENTE O AMOR, SEM NADA PEDIR EM TROCA.
    ABRÇS

    Zilanicelia.blogspot.com
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